
Manaus (AM) – A já alarmante crise na segurança pública do Amazonas, marcada por dívidas milionárias e o consequente recolhimento de viaturas policiais que deixam Manaus à mercê de assaltos em plena luz do dia, ganha contornos ainda mais dramáticos no interior do estado. Soma-se a esse cenário a redução drástica no orçamento da segurança pública e o descumprimento de promessas de reforço no efetivo policial.
Uma inspeção minuciosa do Ministério Público do Estado do Amazonas (MPAM) na 43ª Delegacia Interativa de Polícia (DIP) de Nhamundá – município localizado a mais de 300 quilômetros da capital – revelou um cenário de abandono e irregularidades que comprometem gravemente a prestação de serviços essenciais à população e a própria dignidade humana.
A situação em Nhamundá é um reflexo preocupante da fragilidade da estrutura policial em diversas cidades do interior, onde a ausência de delegados titulares e à crônica falta de recursos básicos são uma triste realidade.
A Promotoria de Justiça de Nhamundá, ao identificar falhas gritantes durante sua inspeção, instaurou um procedimento administrativo para fiscalizar a unidade e expediu recomendações urgentes à Delegacia Geral de Polícia Civil e à Secretaria de Segurança Pública (SSP).
O contexto em que essa crise se aprofunda é alarmante: o Governo do Amazonas teve um orçamento de R$ 3,9 bilhões para a segurança pública em 2024. No entanto, para este ano de 2025, a previsão é de um investimento de apenas R$ 3,019 bilhões, o que representa uma redução expressiva de R$ 900 milhões.
Essa diminuição orçamentária é sentida diretamente nas ruas e delegacias. Além disso, a situação é agravada pelo descumprimento de uma promessa do governador Wilson Lima: os 1.000 aprovados no concurso público da Polícia Militar, que deveriam ter sido chamados para reforçar o efetivo no dia 1º de maio deste ano, ainda não foram convocados.
Enquanto a população clama por mais segurança, o efetivo nas ruas permanece defasado e as condições de trabalho precárias.
Abandono e insegurança ─ As irregularidades encontradas na 43ª DIP de Nhamundá são alarmantes e esmiúçam um descaso que beira o inadmissível:
Inquéritos paralisados e atraso na Justiça: Foram identificados 94 inquéritos policiais com o prazo de conclusão expirado, evidenciando uma paralisação nas investigações que prejudica diretamente a justiça e a resposta à criminalidade no município.
Risco à vida dos custodiados: A segurança na delegacia é uma falha crítica, com a presença de uma lâmina de barbear em uma das celas, colocando em risco a integridade física dos presos e a dos próprios agentes de segurança.
Condições desumanas: A dignidade dos custodiados é severamente comprometida: nem todos possuem local adequado para dormir, e a unidade não dispõe de cela específica para a custódia de mulheres.
Despreparo para vítimas: Não há espaços apropriados para o atendimento humanizado às mulheres vítimas de violência, demonstrando uma completa falta de sensibilidade e estrutura para casos tão delicados.
Falta de organização e segurança de provas: A ausência de locais seguros para a guarda de objetos apreendidos, como drogas e armas, representa um risco à cadeia de custódia e à própria segurança da delegacia.
Plantão inexistente: A promotora Ana Carolina Arruda Vasconcelos constatou que a delegacia não opera em regime de plantão 24 horas. Após as 18h, os policiais ficam apenas em “sobreaviso”, deixando a população desassistida em situações de emergência.
Vácuo de liderança e meios: A situação é ainda mais grave com a ausência de um delegado titular desde abril de 2024, completando mais de um ano sem a presença física da autoridade policial. Soma-se a isso a falta de viatura desde abril de 2025, impossibilitando o deslocamento para ocorrências e o patrulhamento.
A promotora de Justiça ressalta que a presença de um delegado titular e a disponibilidade de viatura são requisitos mínimos para o funcionamento adequado de qualquer delegacia e para a garantia da segurança dos cidadãos.
O MPAM, como órgão fiscalizador, se comprometeu a acompanhar de perto a situação, buscando o diálogo institucional, mas sem hesitar em adotar medidas jurídicas cabíveis caso as recomendações não sejam atendidas.
As exigências do MPAM incluem inspeções semanais nas celas, formalização do registro da lâmina encontrada, implementação de escala 24 horas, provisão de materiais essenciais aos presos e, em prazos que variam de 10 a 120 dias, a nomeação urgente de delegado titular, destinação de viatura, criação de espaço para atendimento humanizado a mulheres, cela feminina e locais seguros para apreensões.
Este cenário em Nhamundá é um grito de socorro do interior e expõe a urgência de uma reestruturação profunda na segurança pública amazonense. As constantes falhas, os cortes orçamentários e o descaso com o reforço do efetivo policial mostram que o estado precisa sair da inércia para garantir a proteção de seus cidadãos, seja em Manaus, seja nas comunidades mais distantes.
Da Redação, com informações da assessoria de imprensa