“Portanto, a transição energética passa pela transição gerencial, de infraestrutura e de vontade política para proteger a Amazônia da melhor maneira possível: atribuindo à floresta uma função econômica que seja inteligente, sustentável e inadiável”.
Nelson Azevedo* ([email protected])
O Brasil anunciou na semana passada seus propósitos de proceder à transição energética. As intenções merecem aplausos e as ações subsequente mais ainda. De acordo com os ministros da Fazenda e do Meio Ambiente, a liderança mundial do país na questão ambiental será, definitivamente, assumida na medida em que as alternativas energéticas baseadas nos combustíveis fósseis sejam removidas. A tarefa é hercúlea e supõe etapas obrigatórias. E uma delas se refere à Amazônia, a pátria das alternativas energéticas que, ironicamente, tem boa parte de sua população às escuras.
Sem energia
O desequilíbrio regional energético se agrava se observamos que 26% da energia do país vem da Amazônia, porém, entre os municípios da região têm 1 milhão de pessoas que não contam com acesso regular de luz elétrica. Usufruem apenas algumas horas do dia, através de geradores. E outros 3 milhões de habitantes não integram o Sistema Interligado Nacional, a coordenação dos produtores 3 distribuidores de energia em território nacional.
Santa paciência
No final do século XX, a Suframa, gestão Mauro Costa, convocou os estados que formam a Amazônia Ocidental, mais o Amapá, área sob sua jurisdição, para estudos de viabilidade e mobilização para uso de energia solar nos municípios mais isolados, principalmente. Faltou vontade política no percurso. Mais recentemente as entidades da indústria pautaram a iniciativa visando implantar fábricas de placas e baterias para viabilizar a obviedade da solução no âmbito da infraestrutura. Foi quando se descobriu um veto do GT-PPB, o grupo de trabalho do MCTI e MDIC que monitoram/decidem o que pode e o que não pode ser produzido em Manaus. Santa paciência.
Combate ao desmatamento
O propósito dessa reflexão, que fique bem claro, não é cutucar nem fulanizar a questão. A intenção, além dos aplausos às discussões da transição energética é sugerir que sejam incluídas nas prioridades do BNDES, agente financeiro do Fundo Amazônia para o combate ao desmatamento, a fabricacao de placas e baterias, entre outros artefatos e componentes para o cardápio fabril do Polo Industrial de Manaus. Essa diversificação não compromete nenhum empreendimento do Sudeste industrial brasileiro pois os fornecedores principais e, praticamente, exclusivos estão no Sudeste Asiático.
Transição e protagonismo
Como contrapartida, podemos ajudar o propósito meritório dos ministros da Fazenda e Meio Ambiente a assegurar a liderança global com a remoção efetiva dos combustíveis fósseis. Ou pelo menos, substituir o diesel por placas solares, hidrogênio verde, biomassa, itens que podem posicionar a nação como o protagonista em questões ambientais que decretou o fim do óleo diesel na floresta. A transição energética seria, então, essencialmente ecológica pois estimularia práticas sustentáveis, beneficiando tanto o meio ambiente quanto a economia a longo prazo.
Energia limpa
O desenvolvimento e a implementação de tecnologias de energia renovável exigem, porém, investimentos substanciais. O custo inicial pode ser significativo para o governo e para as empresas privadas, mas os países poluidores já criaram ativos financeiros para apoiar produtores/exportadores de energia limpa. E certamente essa receita ocupa um lugar destacado, porém discreto, das intenções do ministério da Fazenda e de sua parceira, do Meio Ambiente.
Fiscalizar, flagrar e punir
O mesmo raciocínio pode ser aplicado à recuperação da BR-319. Vejam bem. Não estamos falando de construção da BR-319, o que implicaria em abrir novas picadas na floresta. Elas já estão abertas. Recuperar essa rodovia significa poder fiscalizar, flagrar e punir o crime de mais de 2 milhões de hectares que foram removidos por depredadores que atuam livremente na região sem que o Estado Brasileiro faça qualquer coisa para impedir. Com estrada, radares, satélites e inteligência artificial o combate ao desmatamento é possível, assim como o fomento ao empreendedorismo sustentável.
Vontade política
E para se ter uma ideia, toda a Amazônia legal participa com menos de 0,2% do mercado mundial de produtos tropicas como cacau, pimenta do reino, castanhas, peixes, entre outros itens da produção precária, ou seja, sem energia, transporte ou comunicação adequadas. Portanto, a transição energética passa pela transição gerencial, de infraestrutura e de vontade política para proteger a Amazônia da melhor maneira possível: atribuindo à floresta uma função econômica que seja inteligente, sustentável e inadiável.
*Nelson é economista, empresário e presidente do Sindicato da Indústria Metalúrgica, Metalomecânica e de Materiais Elétricos de Manaus, conselheiro do CIEAM e vice-presidente da FIEAM.