A importância dos insetos como bioindicadores da qualidade das águas  

 

Por Cláudia Lima*

 

Manaus (AM) ─ A diversidade da fauna encontrada em rios, riachos, igarapés e lagoas em quaisquer dos biomas brasileiros é, além de abundante, crucial para a manutenção da qualidade das águas e do ambiente circundante, partindo da interação ecológica entre as espécies, que realizam ciclagem de nutrientes, mantêm o equilíbrio da cadeia trófica e purificam a água por meio de seu metabolismo.

 

A conservação desses ecossistemas é fundamental para essa fauna e para organismos terrestres, inclusive o ser humano, que utiliza as águas para suas atividades diárias e sobrevivência.

 

Podemos encontrar uma riqueza de organismos que desempenham papel essencial nesses ecossistemas e, a depender da profundidade, velocidade das correntes e da quantidade de oxigênio dissolvido, essa riqueza e abundância pode variar entre peixes, anfíbios, moluscos, repteis, mamíferos e o grupo dos invertebrados mais abundantes do planeta, os insetos, com novas espécies sendo descritas a cada dia e muitas outras ainda por descrever. Além disso, os insetos apresentam importância econômica, cultural, alimentar e médica, quando transmitem doenças, dentre os quais um exemplo bem popular é o Aedes aegypti, vetor da Dengue, Chikungunya, Zika e da Febre Amarela Urbana.

 

 

Os insetos aquáticos, aqueles que possuem pelo menos uma parte do seu ciclo de vida na água (chamados de ninfas ou larvas), podem ser encontrados em mbientes lóticos (forte correnteza) ou lênticos (remanso), em microhabitats como folhiço, areia, pedras, galhos e raízes, se alimentando de detritos e de outros insetos e, ciclando nutrientes, disponibilizam matéria orgânica como alimento para organismos menores, ao mesmo tempo que purificam as águas, o que faz deles grandes bioindicadores da qualidade dos mananciais.

 

Como bioindicadores da qualidade das águas, os insetos aquáticos se classificam como: resistentes (resistem bem a ambientes poluídos); tolerantes (resistem a ambientes com baixo teor de poluição) e sensíveis (não toleram poluição). Sendo assim, a presença/ausência nos ecossistemas aquáticos de grupos específicos de insetos pode nos dar um panorama da saúde desses ambientes. Nesse sentido, pesquisadores em campo coletam e catalogam os espécimes com o intuito de, além de descrever e registrar essa fauna, aferir a qualidade dos cursos hídricos, tomando como base a classificação em que estão inseridos.

 

Em pesquisas de biomonitoramento ambiental, com base na fauna de insetos coletada nas bacias hidrográficas, ou na ausência delas, é possível ainda estimar os níveis dos impactos antrópicos. Mas, como isso é possível? Nos ambientes onde são coletados insetos considerados sensíveis à poluição, como os da ordem Ephemeroptera ou “siriruias”, infere-se que aquele curso hídrico permanece intocável ou potável, afinal, com respiração branquial, esses insetos são dependentes de altos níveis de oxigênio dissolvido na água, o que só é possível em ambientes aquáticos isentos de degradação. Em contrapartida, sua ausência preocupa, especialmente em tempos de altos índices de alterações climáticas, como reflexo das interferências humanas, levando muitas à categoria de espécies ameaçadas. Já no grupo dos tolerantes, os Odonatas, ou as populares “Libélulas”, “Jacintas”, ” Lava-bunda” ou “Donzelinhas”, como diz o nome, toleram ambientes pouco antropizados, podendo até ser encontradas próximos a ambientes urbanos, todavia, sua abundância diminui à medida que aumenta a urbanização.

 

Nossa maior atenção deve estar focada no grupo de espécies consideradas resistentes, como os insetos da ordem Diptera, família Chironomidae. Sua presença aliada à ausência de grupos sensíveis, exprime um cenário negativo e crítico. Estes organismos não apenas resistem bem a ambientes aquáticos hipóxicos, como também podem sobreviver a longos períodos de seca e, adormecidos protegidos em substratos, aguardam a chegada das cheias, onde inimaginavelmente, emergem em alados, exibindo toda sua performance adaptativa. Apesar de sua resiliência, coletar Chironomidae em mananciais consideramos potáveis, especialmente em unidades de conservação, áreas protegidas ou nascentes, revela quadros extremos, visto que sua presença está intrinsecamente relacionada às atividades antrópicas, como agropecuária, mineração, indústria e esgotos domésticos, assim, depreende-se que tais ecossistemas se encontram sob grave ameaça.

 

A degradação dos ecossistemas aquáticos se tornou um dos maiores desafios enfrentados no século atual, recorrer aos insetos aquáticos para estimar essa degradação tem sido uma ferramenta extremamente eficaz, de baixo custo e, de certa maneira, de fácil acesso. Pesquisadores de institutos de pesquisa e universidades renomados no mundo todo, como Clemsom University, na Carolina do Norte, EUA, Universidade de León, na Espanha ou o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia/INPA, Amazonas, têm fundamentado seus estudos baseados nas respostas que estes organismos fornecem. Apesar de toda sua riqueza, abundância e função ecológica, os insetos aquáticos tem sido os primeiros a sofrerem os impactos da poluição e das alterações climáticas e, à medida que as sociedades se desenvolvem e desrespeitam o meio ambiente, em breve, muito em breve, não os teremos mais como agentes de mitigação dessa severa intemperança.

 

 

*Claudia Lima é Doutoranda em Entomologia pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA.

Artigo anteriorMP Eleitoral aponta condenação e pede que Adail Pinheiro continue inelegível em Coari
Próximo artigoMPAM recomenda medidas para o enfrentamento da estiagem em Eirunepé e Jutaí