
Manaus (AM) ─ Os ministérios dos Transportes e do Meio Ambiente e Mudança do Clima anunciaram, nesta terça-feira (15/07), um acordo inédito para a criação do Plano BR-319, um conjunto de medidas que busca viabilizar, de forma sustentável, a pavimentação da rodovia BR-319, que liga Manaus (AM) a Porto Velho (RO).
A estrada, com 882 quilômetros de extensão, é considerada um dos projetos de infraestrutura mais controversos do país devido ao seu alto potencial de impacto ambiental na Amazônia.
Firmado entre os ministros dos Transportes, Renan Filho e do Meio Ambiente, Marina Silva, o plano tem como premissa evitar que a pavimentação repita o histórico de destruição ambiental causado por obras similares, como a BR-163 (Cuiabá–Santarém).
O objetivo central é estabelecer bases sólidas de governança, proteção ambiental e desenvolvimento sustentável ao longo da rodovia, considerada essencial para a integração terrestre da capital amazonense com o restante do país.
O plano prevê a elaboração de uma Avaliação Ambiental Estratégica (AAE), a ser realizada por uma consultoria independente e especializada. O estudo terá prazo de oito meses para mapear riscos e indicar medidas que devem ser adotadas antes da retomada do processo de licenciamento da obra.
Uma das principais metas é proteger uma faixa de 50 quilômetros de largura de cada lado da estrada, considerada zona crítica de impacto ambiental. A estatal Infra S.A., vinculada ao Ministério dos Transportes, será responsável pela contratação da consultoria.
O plano também contempla a regularização fundiária, proteção de terras indígenas e unidades de conservação, ordenamento de ocupações em glebas públicas e incentivos a cadeias produtivas sustentáveis com base em práticas agroflorestais.
Além disso, serão implantadas ações concretas de monitoramento, combate ao desmatamento, fiscalização ambiental e controle de incêndios, visando garantir que o asfaltamento não provoque uma explosão de degradação ambiental.
A proposta é uma resposta à longa série de impasses que paralisam a rodovia desde a década de 1980. Inaugurada durante o regime militar, a BR-319 já foi asfaltada, mas passou a ser praticamente intransitável durante o período de chuvas.
Hoje, apenas os extremos da estrada, próximos a Porto Velho e a Manaus, permanecem pavimentados. O “trecho do meio”, com aproximadamente 400 km, é o principal foco de discussão.
Judicialização ─ Em 2022, o Ibama concedeu uma licença prévia ao DNIT para a pavimentação do trecho central, mas o processo foi judicializado devido ao não cumprimento das condicionantes ambientais.
No início de julho deste ano, a Justiça Federal restabeleceu a liminar que suspende essa licença, após recurso apresentado pelo Observatório do Clima, que alegou inconsistências técnicas e legais. A entidade aponta que a liberação da licença resultou em uma escalada de 122% no desmatamento da região entre 2022 e 2023.
A BR-319 também tem sido foco de tensão política. Em maio, durante uma sessão no Senado, a ministra Marina Silva foi duramente criticada por parlamentares como Omar Aziz (PSD-AM), Plínio Valério (PSDB-AM) e Marcos Rogério (PL-RO), que acusaram o Ministério do Meio Ambiente de atrasar o desenvolvimento regional ao se opor à obra.
A rodovia corta um dos maiores mosaicos socioambientais do país, incluindo terras indígenas (19%), unidades de conservação (32,8%), assentamentos, glebas públicas e propriedades privadas sem regularização fundiária. Esse cenário aumenta a complexidade da empreitada e reforça a necessidade de um planejamento meticuloso.
O Ministério do Meio Ambiente afirmou, em nota, que o plano cria as condições necessárias para que a discussão sobre a pavimentação avance de forma responsável. Já o Ministério dos Transportes destacou que o objetivo é “conciliar desenvolvimento regional com sustentabilidade e garantia de direitos”.
Com o Plano BR-319, o governo Lula tenta encontrar um ponto de equilíbrio entre o imperativo da infraestrutura e os compromissos com a preservação da Amazônia – uma equação que ainda gera resistência entre ambientalistas e especialistas.
Da Redação, com informações da Folha de S.Paulo