
Manaus (AM) – A investigação sobre a trágica morte de Benício Xavier Freitas, de apenas 6 anos, entrou em uma fase decisiva nesta quarta-feira (17/12). O empresário Edson Sarkis e os demais proprietários do Hospital Santa Júlia compareceram ao 24º Distrito Integrado de Polícia (DIP) para prestar depoimento.
A oitiva dos donos da instituição é considerada peça-chave para entender se a morte da criança foi resultado de uma sucessão de falhas sistêmicas e omissão na fiscalização administrativa.
Um dos pontos mais graves revelados pelo delegado Marcelo Martins durante o inquérito é a irregularidade administrativa no cadastro profissional da médica Juliana Brasil.
Segundo a Polícia Civil, o Hospital Santa Júlia — que é o responsável direto pela alimentação dos dados de seu corpo clínico — cadastrou a profissional como pediatra na plataforma do Ministério da Saúde.
A investigação confirmou que a médica não possui especialização reconhecida na área de pediatria. O ato de declarar informações falsas em sistema oficial pode configurar o crime de falsidade ideológica por parte de quem realizou o cadastro em nome do hospital.
Além disso, a unidade permitia que a médica utilizasse carimbo e assinatura identificando-se como pediatra dentro das dependências do pronto-socorro, o que viola frontalmente as normas do Conselho Federal de Medicina (CFM).
Nove miligramas de adrenalina na veia ─ Durante os depoimentos, os proprietários foram confrontados com os protocolos internos (ou a falta deles) que permitiram que Benício recebesse uma dose cavalar de medicação.
O menino, que deu entrada na unidade andando e apresentando apenas sintomas de laringite (tosse seca e febre), recebeu três doses de adrenalina pura diretamente na veia, totalizando 9 miligramas.
Para especialistas, a dosagem é estarrecedora: o protocolo para o quadro de Benício previa inalação (nebulização), e não aplicação intravenosa. A dose aplicada é indicada apenas para adultos em situações extremas de parada cardiorrespiratória. A
liberação do medicamento ocorreu sem a dupla checagem obrigatória e sem qualquer validação farmacêutica, expondo a fragilidade na segurança do paciente dentro do hospital.
Omissão e agonia no atendimento ─ A Polícia Civil já possui provas de que a médica admitiu o erro na prescrição em relatórios internos e mensagens de celular. Mesmo com a rápida piora de Benício após a medicação, a transferência para a Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) demorou horas para ser efetivada.
O menino sofreu seis paradas cardíacas antes de falecer na madrugada do dia 23 de novembro. Os donos do Hospital Santa Júlia alegaram em depoimento que a instituição mantém normas rígidas para evitar erros médicos.
Contudo, a investigação foca agora em por que esses mecanismos falharam e por que uma profissional sem especialização estava atuando e sendo apresentada oficialmente ao governo e aos pais como pediatra.
Os próximos passos ─ O material colhido, incluindo os depoimentos de Edson Sarkis e diretores, será anexado ao prontuário médico e aos registros eletrônicos já apreendidos. O inquérito será encaminhado ao Ministério Público, que decidirá sobre a denúncia criminal.
A responsabilização pode atingir não apenas a médica, mas também a cúpula do hospital por falha grave de gestão e fiscalização, além do crime de falsidade documental no sistema de saúde.
Da Redação







