PF aponta venda de ouro por militares e ‘recepção’ a garimpeiro em quartel em Manaus

Abimael Alves foi o militar preso na operação Jurupari, em junho ─ FOTO: Divulgação 

 

São Paulo (SP) ─ Uma investigação da Polícia Federal apontou que ouro extraído de garimpos ilegais na Amazônia foi comercializado por militares do Exército a mando do tenente-coronel Abimael Alves Pinto, preso no dia 27 de junho deste ano durante a operação Jurupari. De acordo com a PF, o militar era quem coordenava operações na região e teria recepcionado um líder garimpeiro dentro do Batalhão de Infantaria de Selva, em Manaus.

 

A polícia apura indícios de que o oficial fornecia informações privilegiadas sobre ações do Exército e PF em troca de propina. Parte desse dinheiro teria sido pago com o minério. As informações são do jornal O Globo.

 

─ Também foi possível constatar que Abimael se utilizou de militares de patente menor para realizar a venda de ouro que conseguia com o garimpo ilegal, atividade essa que realizava dentro do horário de trabalho -, diz um trecho do relatório da PF ao qual O Globo teve acesso.

 

A PF indiciou o tenente coronel pelos crimes de usurpação de patrimônio da União, lavagem de dinheiro, associação criminosa e tentativa de impedir ação fiscalizadora do Poder Público — ele também é alvo de um inquérito na Justiça Militar.

 

A defesa de Abimael refuta as acusações e diz que ele teve o seu nome “envolvido injustamente por pessoas inescrupulosas”. “O militar não tem qualquer envolvimento com os garimpeiros, não praticou qualquer ato ilícito e jamais recebeu valores para dar informações privilegiadas que pudessem interferir nas operações de combate aos garimpos ilegais nos estados de Rondônia e Amazonas”, diz nota assinada pelo advogado Fernando Madureira.

 

O Exército afirmou que o tenente-coronel foi indiciado em um inquérito policial militar “com o propósito de apurar a existência de infração penal e a autoria de crimes levantados pela investigação da Polícia Federal”. A Força acrescentou que tem “proporcionado total apoio” à PF para os esclarecimentos sobre o caso.

 

Mensagens ─ Uma das provas elencadas pela PF é um diálogo entre o tenente-coronel e um cabo, em agosto de 2020. O subordinado envia ao superior a foto de um bolo de notas de dinheiro no bolso de um uniforme militar. Segundo os investigadores, o montante havia sido levantado com a venda do ouro retirado de garimpos. Nas mensagens, o cabo diz que está “com medo” de depositar tantas cédulas no banco.

 

─ Chefe, é o seguinte, a quantidade de cédulas por envelope é de 20 cédulas. O que o senhor acha? O banco já não dá para entrar ninguém, fechou 15h para depositar na boca do caixa. E eu acho muito perigoso ficar contando dinheiro e botando no envelope lá -, diz ele. Abimael, então, responde: “Pode ir lá. Faça com calma”.

 

Em outubro de 2020, o mesmo cabo recebe uma ordem do tenente coronel para receber no batalhão uma pessoa de nome “Ildo”. “Um amigo meu, de nome Ildo, irá chegar no Btl (batalhão) às 13h05. Favor recepcioná-lo e trazê-lo até a 1ª Sç (seção)”, diz a mensagem interceptada.

 

Segundo a PF, Ildo se refere a Aldaildo Fongher, investigado por liderar garimpos ilegais na região do Japurá, no Norte do Amazonas. Ele era o responsável pelo “pagamento do militar de alta patente para fins de repassar informações do EB (Exército) e da PF de combate ao garimpo ilegal”, conforme o relatório. Alvo de um mandado de prisão preventiva expedido pela Justiça Federal do Amazonas em junho, ele chegou a ser preso em flagrante transportando barras de ouro um mês antes. Atualmente, está em liberdade. A defesa dele não retornou aos questionamentos da reportagem.

 

“Dinheiro vem de fonte ilegal” ─ Com base em conversas captadas pela PF, os investigadores concluíram que o tenente-coronel se auto intitulava de “Robin Hood” e sabia da origem ilegal do dinheiro. “Infelizmente, se for fazer uma análise bem correta, esse dinheiro vem de fonte ilegal. Não é imoral, porque não roubamos, mas é ilegal, vem de fonte não oficial e legalizada”, afirma ele em uma mensagem enviada a uma familiar.

 

Em outro diálogo, o militar diz a um amigo que pagaria US$ 1,5 milhão (R$ 7,5 milhões, na cotação atual) por uma garrafa cheia de mercúrio, segundo a PF. O material pesado costuma ser utilizado para separar o ouro do solo nos garimpos ilegais da Amazônia. “Ei, coronel, por que esse negócio é caro e o que que faz com isso?”, pergunta o interlocutor, que recebe a seguinte resposta do militar: “Esse material que eu tô precisando. Se o cara tiver essa garrafa, eu pago um milhão e meio dólares, beleza? Vê aí a quantidade, 34.5 kg. Se o cara conseguir só 1 kg também, a gente faz a divisão e paga o quilo pra ele, beleza?”.

 

Em junho, O GLOBO revelou que o tenente-coronel havia recebido cerca de R$ 930 mil entre 2020 e 2022, de acordo com a PF. Os pagamentos teriam sido feitos por meio de uma empresa de exportação de minérios sediada em Porto Velho. O dono dessa companhia foi preso preventivamente.

 

Na ocasião, a defesa do militar afirmou que ele “sempre combateu o garimpo ilegal” e que o nome dele foi citado por “criminosos em represália ao seu trabalho”. Ao GLOBO, o advogado disse que aguarda “instrução do processo” para “revelar o nome das pessoas que tentam prejudicá-lo”.

 

Com informações do site O Globo

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